Um assunto bastante abordado é sobre as lesões cervicais não cariosas. Na maioria das vezes, ocorrem em vários dentes em um único individuo, incluindo em ambas as arcadas e podendo apresentar diferentes níveis de severidade. As LCNC apresentam principalmente nas faces vestibulares dos dentes, sendo mais pronunciadas em pré molares e molares, seguidas de incisivos e caninos, principalmente na maxila em comparação com a mandíbula.
O processo de formação e progressão da LCNC possui uma base multifatorial que envolve, principalmente, três mecanismos distintos: biocorrossão, tensão mecânica e fricção, que atuam de maneiras associada na cavidade bucal.
Ácidos de origem endógena
Os ácidos de origem endógena são derivados, principalmente, de distúrbios alimentares (como bulimia) e de doenças gástricas (como gastrite, regurgitação e doença do refluxo gastroesofágico.
Alguns fatores devem ser analisados e levados em consideração na consulta inicial com o paciente como: hábitos alimentares, estilo de vida e medicamentos.
Medicamentos
A ação corrosiva de alguns medicamentos está relacionada com a composição ácida relativa em forma de comprimidos efervescentes e líquidos que apresentam baixo pH. Além disso, muitos desses medicamentos possuem a capacidade de reduzir a taxa de fluxo salivar ou capacidade tamponante da saliva. Os medicamentos que podem conduzir a tais efeitos incluem anti-histaminicos, tranquilizantes, esteroides utilizados em inaladores (para tratamento da asma), composto a base de acetilsalicílico e comprimidos a base de ácido ascórbico.
Grupo de risco ocupacional
Dentre os grupos específicos destacam-se os atletas envolvidos em atividade física (grandes consumidores de energéticos e isotônicos), nadadores profissionais (contato constante com a água da piscina tratada com sustâncias químicas), baristas (degustadores de café), outros degustadores de bebidas destiladas e trabalhadores em fábricas de produtos ácidos.
As pessoas envolvidas em atividades físicas frequentemente podem apresentar maior risco á corrosão devido ao uso frequente de energéticos e isotônicos, suco de frutas e bebidas gaseificadas. Associado a esse fato, durante as atividades físicas ocorre a desidratação do organismo (pela perda de fluidos corporais) levando a redução do fluxo salivar, e intensificação no consumo de bebidas repositoras de eletrólitos, que apresentam pH abaixo do crítico para desmineralização do esmalte dental (pH5,5).
Ao receber um contato oclusal no longo eixo do dente, o ligamento periodontal consegue exercer o seu papel e dissipar a tensão de uma maneira mais homogênea (sem sobrecarregar o dente e as estruturas de suporte. Entretanto, os movimentos que propiciam contatos prematuros ou interferências oclusais ou decorrentes de hábito parafuncionais como bruxismo e apertamento dentário, gerarão acumulo de tensões em alta intensidade na região cervical.
A região cervical é mais susceptível á perda de estrutura pelo acumulo de tensões devido á baixa espessura de esmalte, cemento e dentina pouco resistente em virtude da orientação dos túbulos dentinários e prismas de esmalte nessa região. Portanto a direção, intensidade e frequência das forças oclusais são fatores relevantes na formação das LCNC, bem como na longevidade das restaurações cervicais.
A influência do tratamento ortodôntico
Dentro do fator tensão, é importante destacar o papel das forças ortodônticas relacionadas á presença de recessão gengival e de hipersensibilidade dentinária.
O tratamento ortodôntico utiliza forças cíclicas aplicadas no elemento dental, que provêm principalmente de dispositivos mecânicos planejados.
É importante lembrar que, diante de um paciente que está realizando um tratamento ortodôntico, temos também a presença de forças oclusais não ideais atuando juntas sobre o dente, a movimentação ortodôntica pode gerar efeitos nocivos no ligamento periodontal do paciente.
Hipersensibilidade dentinária
Trata-se de uma lesão frequentemente associada a LCNC. É caracterizada como uma dor aguda e provocada, de curta duração, originaria da dentina cervical exposta a estímulos térmicos, evaporativos, táteis, osmóticos e /ou químicos e que não podem ser atribuídos a outra forma de defeito ou patologia dental. Da mesma forma que a LCNC, a HD apresenta etiologia multifatorial, envolvendo a mesma associação dos fatores de tensão, fricção, biocorrosão.
A teoria hidrodinâmica da dor é a teoria mais aceita para a explicação da hipersensibilidade dentinária.
Protocolo clínicos
Controle da hipersensibilidade dentinária cervical.
Devido á etiologia multifatorial das LCNC e da sua forte associação com alterações como HD e RG, diversas situações clinicas podem estar associadas com esta doença. Por esse motivo, cada tipo de situação exige uma conduta distinta e na maioria das vezes, multidisciplinar para a resolução de problemas.
A primeira sessão clínica é mais importante do tratamento. Na situação clínica em que há Hipersensibilidade dentinária, sem a presença de perda de estrutura dental e ausência de condições para recobrimento radicular, a melhor opção é a utilização de produtos tópicos conhecidos como agentes dessensibilizantes. Diante do que foi discutido anteriormente sobre o mecanismo da HD, é possível verificar que os agentes dessensibilizantes podem ser divididos de maneira geral em agentes de ação neural (atuam diretamente nas terminações da dentina exposta), obliteradores (atuam no vedamento dos túbulos dentinários, impedindo a micro movimentação do fluido no interior dos túbulos.
| Situação clinica | Conduta terapêutica |
| Exposição dentinária sem perda significativa | Controle dos fatores etiológicos + Protocolo de dessensibilização |
| Exposição dentinária sem perda significativa de estrutura com hipersensibilidade dentinária e recessão gengival (HD+RG) | Controle de fatores etiológicos + recobrimento radicular |
| Exposição dentinária com perda significativa de estrutura sem recessão gengival (HD+ LCNC) | Controle de fatores etiológicos + Restauração da LCNC |
| Exposição dentinária com perda significativa de estrutura com recessão gengival (HD + LCNC +RG) | Controle dos fatores etiológicos + Restauração da LCNC + Recobrimento radicular |
Não existe na literatura um protocolo considerado padrão para a resolução de todos os casos. Assim, recomenda-se a associação correta de diferentes agentes com mecanismo de ação distintos para o sucesso da dessensibilização, levando em consideração as características individuais de cada paciente.
O que deve ressaltar é que o tipo de agente a ser utilizado será determinado, principalmente em função do tipo de dentina presente, da profundidade (supra ou subgengival) e do motivo pelo qual a sensibilidade foi originada.
Quando houver um dente sensível devido a um fator principal originado da biocorrosão, ele apresenta maior quantidade de fibras colágenas expostas do que matriz inorgânica, visto que os cristais inorgânicos foram removidos pela degradação do ácido.
Desse modo sugerimos a aplicação de agentes dessensilizantes obliterador precitador de proteínas (como agente á base de glutaraldeído), pois irá associar-se á matriz orgânica exposta e obliterar os túbulos de forma efetiva. Ademais, quando houver intensa atuação do fator fricção ou acumulo excessivo de tensão, haverá maior quantidade de matriz inorgânica e promovem a precipitação de cristais (como agente a base de oxalato e derivados do cálcio).
Nas duas situações descritas anteriormente, recomenda-se que o profissional utilize a associação de diferentes mecanismos para o tratamento da hipersensibilidade.
| Tipo de agente dessensibilizante | Mecanismo de ação |
| Composto á base de potássio
(agente neural ) Ex: Claritant Desense (Angelus), Soothe (SDI), UltraEz (ultradent), Dessensibilize (FGM) e Isodan (Sptodont) |
Agem por meio de um aumento da saturação de potássio nas terminações odontoblástica atuando no processo de despolarização do nervo, impedindo a repolarização e condução nervosa. |
| Oxalatos
(agente obliterador precipitador de cristais ions/sais ) EX: Painless(BM4), Ozagel (kota) |
Agente precipitando cristais de oxalatos que vão reagir com o cálcio presente na dentina expostas, formando oxalatos de cálcio. |
| Glutaraldeidos
(agente obliterador precipitador de proteínas Ex: Gluma desensitizer (Kulzer), Glu-hema (PHS) |
Caraterizado como fixador biológico, os grupos aldeídos do glutaraldeído reagem com os grupos amino presentes no colágeno exposto da dentina, promovendo a formação de uma barreira proteica que oblitera os túbulos. Possuem característica hidrofílicas que permite uma maior penetração do produto no interior dos túbulos dentinários. |
| Vernizes fluoretados
(agente obliterador precipitador de cristais íons/sais ) Ex: Clinpro White Varnish (3M) |
Muito associado ao sódio e ao estanho, promovem uma precipitação de sais fluoretos que reagem com a dentina exposta e desmineralizada, promovendo a remineralização da mesma com a presença de íons flúor, que são mais resistente á presença de biocorrosão. |
| Composto a base de estrôncio
(agente obliterador precipitador de proteínas) Ex: Dessensibilize (FGM) |
Atua ocluindo os túbulos dentinários através da precipitação de proteínas sobre a dentina exposta. |
| Compostos derivados do cálcio
(agente obliterador precipitador de cristais de íons/sais) Ex: Teeth Mate (Kuraray), Nano- P (FGM) |
Promovem a precipitação de íons CA+ sobre a estrutura de dentina que perdeu cálcio e fosfato. Essa reação ocorre de forma que uma camada delgada de fosfato de cálcio, em meio aquoso, quando em contato com íons hidroxila, vai fazer com que haja uma precipitação permitindo a formação de hidroxiapatita e obliterando túbulos. |
| Selantes tubulares adesivos
(agente oblierador) Ex: Clinpro XT Varnish 3M |
São comumente associados ao ionômero de vidro e contém ácidos |
| Laser
Mecanismo de ação física Alta intensidade: alteração tecidual/obliterador Baixa intensidade – modulador neural/aumento do limiar de dor. |
A forma de atuação do laser depende da intensidade em que é aplicado. Quando usado em alta intensidade. Age de forma a vedar os túbulos por um fenômeno descrito como ablação.
A baixa intensidade, age de maneira a aumentar o limiar de dor do paciente em virtude de agir nas terminações associado á aplicação de dessensibilizante neurais. |



